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31/10/2012

GUERRA FISCAL? ENTÃO VAMOS À GUERRA!

Autor: José Carlos Guarino

 

O noticiário econômico recente tem colocado ênfase na chamada Guerra Fiscal ou Guerra dos Portos. É interessante analisar os argumentos trazidos ao público pelos principais Secretários de Fazenda, assim entendidos aqueles que comandam as maiores arrecadações e que por isto mesmo preferimos identificar como Exatores Gordos. Exator é o cobrador de impostos. No início, tinha a função de abordar diretamente os contribuintes e exigir os pagamentos devidos ou assim presumidos. Com o tempo o Exator evoluiu e se tornou uma grande máquina eletrônica, transparente para o contribuinte e extremamente objetivo em suas metas de arrecadação. Afinal, suprir os cofres públicos de recursos é uma tarefa nobre e necessária, constituindo-se no meio de consumar os fins do estado, listados habitualmente como provedor de educação, saúde e segurança aos seus contribuintes. Já os Exatores Magros são os mesmos gestores tributários, porém, com poder de argumentação minimizado por questões de hierarquia numérica. Isto, entretanto, não os diminui. Pelo contrário, engrandece. São obrigados a articular pequenos milagres diários para prover os cofres de seus Estados de recursos que permitam um mínimo de provimento das mesmas necessidades de seus contribuintes e cidadãos. Esta capacidade de criar fontes de renda é o que se convenciona hoje chamar de Guerra Fiscal ou Guerra dos Portos.

Esta situação não é deletéria nem prejudicial ao país como um todo, pois preços de produtos beneficiados por incentivos são menores, e o beneficiado é o cidadão contribuinte. É claro que os Exatores Gordos sentem com as perdas de arrecadação, porém, isto não significa que os Exatores Magros estejam se vangloriando do fato. Conheço Exatores de todas as medidas e sei que ambos querem o melhor para seus contribuintes e cidadãos. Mas não conseguem encontrar o equilíbrio nas ações e não conseguem planejar as inevitáveis mudanças em curso no Brasil mediano. Isto mesmo. O Brasil está buscando um novo nível de desenvolvimento que permita a qualquer cidadão do País dispor de serviços públicos eficientes e com qualidade digna dos seres humanos que somos.

Não é uma questão de quantidade de dinheiro. É uma questão de isonomia. O volume arrecadado é razoável e não deveria ser um objetivo de constante melhora de desempenho. Os contribuintes têm seus limites. Por isto, quero avaliar aqui os papéis dos 3 atores desta Guerra que certamente não queremos, mas infelizmente somos impelidos a coadjuvar.

 

O Contribuinte

 

O papel de Contribuinte não está restrito às empresas ou às classes sociais mais abastadas. Contribuintes são todos os Cidadãos. Desde o dia em que nascem até o dia em que morrem, todos os humanos são Contribuintes. É um papel importante e necessário para nossa organização social. Todo ser humano demanda cuidados, da gestação ao enterro, e o Estado tem papel predominante nisto.

Apesar da isonomia contributiva teórica, a realidade é diferente. É totalmente desigual a contribuição tributária. Alguns impostos são considerados progressivos, isto é, paga mais quem pode, porém a maioria é inflexível. Pagam os mais pobres e os mais ricos na mesma intensidade, independentemente de renda.

As empresas, em geral, contribuem com grandes volumes de recursos, e por sua necessária organização administrativa, controlam os centavos pagos e ao sumarizá-los diligentemente, obtém cifras efetivamente impressionantes. Mas tudo isto não é o nosso objetivo imediato. Queremos apenas colocar foco em nosso papel na tal Guerra Fiscal ou Guerra dos Portos.

Inúmeros mecanismos de arrecadação são utilizados. Dentre eles, um é particularmente importante: ICMS ou Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços. Grande ideia que funcionou bem por muito tempo, até que virou meta de arrecadação. Isto se chama
Substituição Tributária. Ao invés de aguardar a efetiva circulação da mercadoria, convencionou-se antecipar a arrecadação! E o setor Atacadista foi o infeliz alvo desta medida.

Um Atacadista, hoje, ao comprar uma mercadoria que irá revender, frequentemente paga por antecipação até 50% do valor das mercadorias em impostos. Depois, repassa isto para o consumidor final, o grande contribuinte efetivo. Porém, não se poderia esperar um encargo tão singelo dos Exatores Gordos. Mais. Era preciso mais. Assim, por convenção associativa, os Exatores Gordos decidiriam que cada Unidade da Federação iria montar seu próprio sistema de Substituição Tributária. Consequência: um Atacadista com sede em São Paulo, por exemplo, distribuindo produtos em nível nacional, comprará seus produtos pagando antecipadamente, 29,7% de ICMS. Estes impostos no regime de Substituição Tributária não dão direito a crédito, a menos que sejam vendidos para outra Unidade da Federação. Como São Paulo respondia por 33,5% do PIB de 2009, e as demais Unidades da Federação por 66,5%, este atacadista venderia a maior parte de suas mercadorias para outras Unidades Federadas. Neste momento, deveria pagar o ICMS interestadual para São Paulo (9,73% na média) e ficaria com um crédito tributário de 19,97% (29,7% menos 9,73%). Como ele comercializa a maior parte dos produtos para Unidades Federadas, seu crédito tributário corresponderá a 13,28% do total das Vendas!

Quando isto acontece – e acontece com frequência – o contribuinte paulista deverá peregrinar pelas repartições públicas na tentativa de recuperar seus créditos. Isto pode levar anos, caso haja sucesso na empreitada. Os Exatores Gordos não costumam prestar muita atenção em seus contribuintes, assim como os obesos não conseguem enxergar seus umbigos!

E aí começou a tal Guerra Fiscal ou Guerra dos Portos. A opressão tributária aos contribuintes, especialmente os intermediários atacadistas, estimulou a criatividade dos Exatores Magros, que agora são considerados inimigos de guerra e cassados como malfeitores. Será que é assim que os cidadãos contribuintes de suas Unidades Federadas os enxergam? Acho que não. E você?

 

O Exator Gordo

 

Este partícipe não é um malfeitor. É, antes de qualquer coisa, um abnegado defensor de suas posições. Trabalha com objetivos específicos, frios e sérios. Tem que aumentar a arrecadação de sua Unidade Federada, porém, parece que isto não é tão simples nos dias atuais. Já foi mais fácil, mas os tempos são diferentes. Dedica-se em tempo integral a ampliar o campo de arrecadação e a estabelecer novos recordes defensivos de valores. É que já aparecem no horizonte negras nuvens de uma possível reforma tributária, mas se os pilares da continuidade de direitos permite antever uma garantia de níveis de arrecadação em caso de sucesso na empreitada, melhor se prevenir. Aumentar a arrecadação.

Imagino o quão difícil deve ser olhar para baixo quando se está no topo. Na realidade, não imagino. Sei. O que muda é apenas a altura do topo. E quando você está no topo, só se pode olhar para baixo, e isto é incômodo. Assusta. E o susto pode causar reações imprevisíveis. Tipo Substituição Tributária generalizada a qualquer custo! Mesmo que o custo sejam os próprios contribuintes.

Imagino ainda que o ponto de vista privilegiado – ninguém acima de mim – oblitere a visão da realidade. Nada parece ter limite. Posso ir aonde quiser. Afinal, meu sucesso é inconteste! E isto deve servir como facilitador das decisões difíceis que os líderes são instados a tomar. E como líder não hesito. E aperto cada vez mais. A contribuição total está crescendo. Mais do que a economia. Mas isto não acende qualquer sinal de alerta. Imagino que as reclamações são infundadas e patrocinadas por setores interessados apenas em seu próprio bem estar, em suas posições pessoais, em ganhos próprios.

E assim o Exator Gordo segue em frente, inaugurando uma verdadeira Guerra Fiscal ou Guerra dos Portos contra os Exatores Magros. Não faz mal que os contribuintes do Exator Gordo estão pagando menos pelas mercadorias. Isto é irrelevante. O que conta é a arrecadação.

 

O Exator Magro

 

As distorções favorecem as oportunidades. As dificuldades estimulam as soluções. Os Exatores Magros não são Magros porque estão preocupados com a aparência. Estão Magros por causa das carências, das dificuldades dos cidadãos contribuintes de suas Unidades Federadas e precisam trabalhar intensamente na solução do problema: fazer o bolo de arrecadação crescer.  

Não são movidos por ódio ou amor, são movidos por necessidades. Um emprego é mais importante que um dígito a mais na arrecadação. Um jovem com educação formal adequada, com futuro promissor, precisa de emprego. A família precisa de renda. E isto não se produz de forma espontânea. É necessário acelerar o processo para o mesmo ritmo do crescimento populacional.

Mas como fazer isto? As Unidades Federadas desenvolvidas oferecem um mercado interno melhor, atraem empresas com maior facilidade e absorvem todos os investimentos possíveis por parte dos empresários. Porém, nem tudo está perdido. Empresários são movidos por oportunidades e por carinho também.

Um Exator Magro vive sérios dilemas. Tem contas para pagar e não tem arrecadação suficiente. As contas são tormentosas e pesadas, pois o nível de renda da população é baixo e não permite ajudar na cobertura dos gastos. O que fazer?

Pensar, criar e inovar. Assim pensando, foram sendo oferecidos óbvios incentivos catalisadores de investimentos: menor incidência tributária em retribuição à criação de empregos e participação no desenvolvimento de algumas Unidades Federadas. E tais programas foram modelados, especificados e implementados. E fizeram sucesso. Por quê? Por que criaram uma válvula de escape para os contribuintes submetidos à drenagem financeira de suas operações.

E isto representou uma perda? Depende do ponto de vista. Olhando como um Exator Gordo, só vejo problemas. Estou sendo drenado de importantes recursos e isto eu não aceito. Declaro Guerra! Do ponto de vista do Exator Magro, só vejo sucesso. Crio empregos onde antes existiam carências, crio renda que movimenta a economia interna e não estou no momento preocupado com o problema de comodismo do Exator Gordo. Até acho que ele deveria se exercitar mais e gerar ideias evolutivas!

 

Conclusão

 

De fato o assunto Guerra Fiscal ou Guerra dos Portos é uma ficção. Não existe nada que impeça uma Unidade Federada menos desenvolvida de lutar pela evolução das condições de vida de seus cidadãos. Não deveríamos ver isto como um problema, mas como uma competição, cujo salutar resultado moldado na evolução constante certamente poderá trazer benefícios à Nação como um todo. As atitudes “dono da bola” não cabem mais em nossas vidas e enquanto contribuintes devemos lutar incessantemente pela redução da incrível carga tributária não correspondida em serviços!

 

Viva a Guerra!

 

José Carlos Guarino é Contador e Consultor de Empresas, especializado em Sistemas Integrados de Gestão e Planejamento Tributário de operações. Palestrante, tem divulgado o processo de controle fiscal integrado em organização no país, convidando os empresários a se organizar de forma adequada e preventiva, evitando assim penalizações totalmente desnecessárias. Outubro, 16, 2012. guarino@radarfiscal.com